A revolução de paz furando a bolha
- Elaine Silva
- 22 de jun.
- 5 min de leitura
Com bolsas e formações remuneradas, moradores de favelas se preparam para ensinar yoga onde nasceram e cresceram. A ideia é semear, de dentro para fora, a filosofia que convida ao equilíbrio, à escuta e à presença.

O Pegada Sustentável nasceu do desejo genuíno de contar histórias de gente que semeia, e não estamos falando apenas no sentido literal, do pequeno agricultor que planta e colhe (este também, mas não apenas). A história de hoje cabe essencialmente na metáfora da semeadura. Isso porque, muitas vezes, as árvores mais frutíferas e as flores mais belas não chegam a florescer por falta de recursos, já que para colher é preciso plantar.
O projeto TransFORMAÇÃO é uma semente potente plantada em áreas de vulnerabilidade social. Sem necessidade de escolaridade ou experiência prévia, o programa vai formar gratuitamente 160 professores de yoga nas favelas do Rio de Janeiro e de São Paulo. O curso é 100% gratuito e, além da certificação profissional, a capacitação técnica engloba também orientação financeira para ajudar o profissional a desenvolver habilidades empreendedoras dentro dessa área de atuação.
Para Rê Mozzini, fundadora da escola de formação de professores de yoga, a Yoganaya School – que será a instituição responsável técnica pela capacitação – o propósito do programa é atravessar os muros invisíveis e fazer o yoga florescer onde antes não havia solo fértil. Levar presença, escuta e respiro a territórios muitas vezes esquecidos, e assim gerar um impacto que vai além do corpo: que alcança o social, o emocional e o coletivo. “A ideia é furar a bolha. O yoga, por muito tempo, foi elitista, praticado, em sua maioria, por pessoas brancas, com recursos e acesso. Sinto um chamado, um propósito muito profundo de tornar essa prática verdadeiramente acessível a todos. Ainda estamos distantes dessa realidade, mas esse projeto é uma semente”, afirma.

Os professores em formação receberão todo o material didático necessário para a jornada. Serão nove módulos no total, cinco presenciais e quatro semipresenciais. A partir da metade do curso, começará o estágio prático: durante seis meses, os alunos oferecerão aulas gratuitas em suas próprias comunidades. Nessa fase, eles receberão as ferramentas de trabalho — tapetinho, caixa de som, banner — e passarão a ser remunerados por hora-aula. O principal critério de seleção é morar nas localidades contempladas. Nesta primeira edição, estão incluídas Rocinha, Vidigal, Chapéu Mangueira, Babilônia, Tabajara, Maré, Muzema, Chácara das Pedras e Cidade de Deus.
“A ideia é ampliar o alcance ao máximo e estar presente em diferentes comunidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. Queremos pulverizar essa iniciativa, fazer com que ela chegue de fato a todos os cantos possíveis. Estamos só começando”, conta Rê Mozzini.

O coletivo que faz a transformação acontecer
Para que o projeto fosse sustentável era fundamental uma articulação com lideranças locais e ONGs, investimento privado e apoio do poder público. Idealizado pelo Instituto Mude, organização sem fins lucrativos que atua promovendo práticas integrativas e complementares de saúde. como yoga, meditação, terapias corporais e rodas de escuta; o TransFORMAÇÃO obteve aprovação da lei do incentivo ao esporte.
O Nubank é patrocinador, que viabiliza o aporte financeiro para a capacitação dos professores e as bolsas de estágio remunerado. Já a Prefeitura do Rio entra com apoio logístico. A Yoganaya School, responsável técnica pelo projeto, já formou mais de 3 mil professores espalhados pelo mundo, e já desenvolvia um trabalho social consistente. Em 15 cidades brasileiras, e, também, em alguns outros países; professores formados pela escola dedicam parte do seu tempo ao Karma-Yoga, oferecendo aulas gratuitas à população como forma de retribuição e serviço comunitário.

A formação do TransFORMAÇÃO abordará diversos temas fundamentais, como filosofia do yoga, alinhamentos e ajustes de ásanas, além de práticas específicas de diferentes linhas, como Hatha Yoga, Vinyasa, Yoga Restaurativa, entre outras. Os professores que ministrarão a capacitação do projeto são os mesmos que atuam na formação regular da Yoganaya School. Todos são referências nas suas áreas de atuação, com ampla experiência no mercado.
Segundo Rê Mozzini, quem será formado passará por um processo profundo de transformação: ganhará uma nova perspectiva de vida, uma profissão e a possibilidade de se tornar economicamente ativo por meio do yoga. Já as pessoas que participarem das aulas receberão muito mais do que uma prática corporal. Vão acessar uma filosofia que muda o jeito de ver e pulsar com a vida.
“Eu acredito muito que a transformação que a gente quer ver no mundo começa dentro de cada um de nós. E é visível que quem mais precisa, muitas vezes, é quem menos tem acesso. O yoga é uma ferramenta poderosa, não só para o corpo, mas também para a mente. Ele ajuda a encontrar equilíbrio, cultivar consciência e paz interior. É uma revolução silenciosa, de dentro para fora. Por isso, faz todo sentido levar o yoga como instrumento de paz também para dentro das comunidades”, conclui
O processo seletivo está em andamento. Já foram selecionadas duas turmas. As inscrições podem ser feitas por este Formulário.
A divulgação das aulas será feita pelo aplicativo da Mude e, também, pelas lideranças locais nas favelas.
O lançamento do TransFORMAÇÃO aconteceu no dia 21 de junho, dia internacional, com aulão gratuito e inspirador, na praia do Arpoador, em Ipanema, Rio de Janeiro.
Onde nasce o propósito
De um lado, super prática, empresária, racional. Do outro, intuitiva, mística e sensível. Mãe de duas meninas lindas, professora e empresária de yoga, a fundadora da Yoganaya School, Rê Mozzini, nem sempre cultivou a paz interior que busca hoje. Ela conta que se iniciou no yoga na época em que trabalhava como modelo, não pela filosofia em si, mas pela busca do corpo padrão exigido pela profissão. Queria um exercício físico para emagrecer, mas acabou encontrando um propósito de vida. “Logo que comecei a praticar, me dei conta de que era uma ferramenta que ajuda a equilibrar o corpo e a mente. E sim, isso ajuda no processo de emagrecimento, mas vai muito além. Me conectei com essa filosofia de uma forma muito profunda desde então.”

Durante 12 anos, ela foi apenas praticante, estudando bastante, mas sem a intenção de ser professora. Nesse período, Rê já empreendia com uma agência de modelos, em São Paulo. Foi quando a vida deu uma rasteira: ela levou um golpe financeiro na empresa e perdeu tudo. Também o relacionamento de 12 anos terminou. “Tudo o que, naquela época, eu valorizava, que eu achava que eu tinha, que eu achava que eu era... eu perdi. Desapareceu.
Nesse momento, o yoga ocupou todos os espaços. Quando eu perdi tudo, o que sobrou era o Eu. Descobri que meu caminho era o yoga. Então, fiz minha primeira formação de professores. Isso foi há 10 anos, e desde aquela época já me conectei com esse projeto que é a escola hoje”, lembra. Rê trouxe essa visão de negócios, de empreendedorismo, para dentro da escola, estruturando e profissionalizando a Yoganaya School para que se tornasse o que é hoje. “Sou formada em administração, fiz um MBA em gestão do luxo. Coloquei toda minha experiência, meu repertório, a serviço do yoga”, conta.
Essa autora que vos escreve é praticante de Yoga e todas as quintas-feiras tenho um encontro com a Rê na aula no Arpoador pela Mude. Sempre abre um portal e o dia começa muito mais consciente e equilibrado. Que sorte a minha!





Um sonho de projeto!!
Iniciativa incrível! Conteúdo lindo e sempre reflexivo.
Projeto lindo de viver!!!
Que ele cresça e floresça, e chegue logo á muitos lugares aqui em Sampa!!!
Lindo texto.
Muito bom